sábado, 18 de dezembro de 2010

Que reacenda o que for pra ficar...


A luz de um novo ano brilha mais adiante, apelo alusivo ao costume intrínsecamente humano de se deter aos ciclos. É interessante o quanto os nossos olhos se atraem a finais, trazendo para fora da toca uma retrospectiva do que foi feito no decurso da história, um retorno do mar aos meandros que o rio percorreu, e aos que ele poderia ter percorrido. A gente olha e apercebe-se da verdade dos fatos: existiram inúmeros "e se" no meio do caminho, que ficarão eternamente sem resposta. E daí, vem, imponderavel, a angústia do poder de escolha. Temos a liberdade de escolher qual caminho dentre tantas bifurcações vamos seguir, mas não temos o poder de saber para onde elas vão nos levar. Mas a verdade é que cada uma dessas escolhas culminam naquilo que vamos nos tornar, incorporadas, numa mistura homogeneizada. Pensamos nas extravagâncias que a nossa alma cometeu. Vejam só, cometemos o disparate de nos entregar as nossas próprias vontades e insanidades. E pior que isso, gostamos! Que politicamente incorreto, não? Talvez, então que bom que o ser humano é mesmo contraditório ao que lhe é imposto, afinal, como ele se reciclaria, e se veria em outras perspectivas, se não cometesse as insanidades que debandam do seu verdadeiro eu, enclausurado nas paredes de sua razão, da dona ética, com sua ordem impressa de contenção? Que tal um brinde então ao passeio pelas vias da nossa loucura. Vamos, traga sua taça de coca para perto da minha, um brinde a voraz sagacidade das coisas espontâneamente vividas!
Bem, a luz de um novo ano nos remete também a recomeço. É aquela incrível sensação de que é possível queimar as páginas da história que não deram certo, como se com as cinzas do incinerado se elevassem ao céu também as marcas do que ficou impresso inexorávelmente em nossa memória permanente, e que a gente torce para que o recalque carregue de uma vez pro inconsciente, ou, caso você não acredite muito no postulado de Freud, que fique dançando por entre as idéias não simbolizáveis, naquele depósito de coisas inúteis da nossa mente cujo a placa diz "não abra". Recomeçar me lembra o querido Mário (não o brother), que diz "Nunca dês nome a um rio, sempre é outro rio a passar; Nada jamais continua, tudo vai recomeçar". E isso funciona para o ano inteiro, mas só assimilamos realmente quando é hora de jogar o calendário fora. Aliás, quem resolveu fatiar o tempo, deveria ter recebido o premio primitivo do Nobel da paz, não existe ilusão mais positiva do que esta. E o que vem a memória como lâmpada acesa de uma idéia recém acessada é: Nova chance. Chegou a hora de se permitir o abandono do velho casulo apertado, o casulo da preparação, da nutrição, da fabricação do desejo de vôo pleno, asas abertas, rumo aos sonhos. Um sobrevôo pelos projetos reformulados. Uma fuga para longe do que poderíamos vir a ser, mas não fomos. Um pouso (talvez turbulento) no porto das possibilidades que se debatem diante de nós, convidativas, um tango de novos momentos tocando na vitrola da vida, girando junto com esse mundo, nos chamando para a (mu)dança.
Por favor, estou quase terminando, não se retire das minhas palavras agora. Prometa-me uma coisa: Prometa-me não fazer de 2011 uma sessão "lamento de Jeremias" pelo que não foi conseguido. Prometa-me também não fazer uma continuação, mas um recomeço total, revestindo de novo tudo o que for colhido. Prometa-me rasgar as fichas de apostas em planos que não vão dar certo. Prometa-me que dotará de criatividade os dias que virão, de tal forma que quem olhe, queira pular para dentro da sua tela de vida, tão colorida e convidativa, quanto uma noite entremeada de estrelas. Prometa-me sacrificar-se por um sonho. Respirar fundo e sorrir como criança diante da expectativa de um presente embrulhado. Prometa-me dar desatenção total aos seus problemas, e rir-se deles, até que desapareçam. Prometa-me que transcenderás, a ponto de compartilhar cada uma das suas alegrias, e ser capaz de transformar tristezas, intervindo na mesmice do mundo com a sua singular capacidade de ser único. Prometa-me atravessar as cortinas e penetrar o profundo universo de outras almas, com tudo aquilo que potencialmente és. Mas principalmente, prometa-me que encontrarás um sentido, em cada pedra a ricochetear pelo caminho, em cada lágrima que, como chuva escorrer mansinho sobre teu rosto, em cada grito que de longe ouvires, em cada semente que em seu coração for semeado, em cada "você" que você conseguir ser, em cada "eu" que permitas entrar. Prometa-me por fim, que não fechará a porta, e que ao apagar de uma velha chama, deixarás que reacenda àquilo que realmente for para ficar.

Com passos de um (re)começo, e partindo de um ano que se finda:
Narriman B.

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